Retrospectivas: 16 anos de história telúrica


Um final de ano é sempre tempo de retrospectivas. Ocorreu-nos também a nós embalar nesse espírito, mas não relativamente aos últimos 365 dias. Antes aos últimos 16 anos. Se é pouco tempo ou muito tempo, dependerá sempre da perspectiva. Se se atender simplesmente à lata cronologia da História, será uma insignificância. Se se tratar da perspectiva de quem viveu os solavancos do percurso e subiu as escarpas íngremes do trabalho feito, é quase uma eternidade. Cremos que recuperar aqui os livros publicados neste intervalo de tempo não será propriamente uma inutilidade. Com toda a certeza será, em primeiro lugar, uma ajuda à reflexão própria de quem a realiza. Partilhá-la terá ainda o objectivo de ser uma forma mais de divulgação, como qualquer outra, das aludidas obras. Reavivam-se assim cadernos de papel invariavelmente imperfeitos, mas cujos conteúdos ainda possam vir a interessar a quem se dedique a temas históricos e etnográficos das terras ou da região aqui «demarcada». 

Será também útil para quem, acima de tudo, ainda se deleite com o conhecimento do passado. Quem vibre com a descoberta apaixonante de um tempo há muito desaparecido. Quem ainda se inquiete, com espanto ou dúvida, mas nunca com indiferença, com os factos que veja serem-lhe revelados pela primeira vez. Quem se emocione, com ou sem lágrimas, com as vozes de quem já só nos fala por citações, documentos, quadros ou fotografias envelhecidas. Quem queira viajar na mais autêntica das jornadas humanas: aquela que nos construiu e fez de nós o que somos e o que temos hoje. E não se propõe aqui um destino remoto, longínquo, de paragens que nunca vimos e que provavelmente nunca veremos. É antes a paisagem do aqui mesmo, destes caminhos e ruas de todos os dias, de tudo aquilo que nos é próximo e que muitas vezes nos é tão próximo quanto desconhecido.

[2008] Villa Recaredi

Foi a primeira monografia sobre a mais nova das freguesias do concelho de Paredes: Recarei. Pode parecer, à partida, pouco entusiasmante um trabalho que verse uma localidade com pouco mais de século e meio de existência autónoma e independente. Contudo, desde logo, o seu teor não se cinge, como facilmente se compreenderá, a esse lapso temporal e administrativo. Sendo o primeiro trabalho de fundo sobre a dita comunidade, ele teve também a preocupação - e, em muitos casos, a obrigação - de ter uma recolha ou levantamento «no terreno» (oral, testemunhal, da tradição, usos e costumes) muito significativo, que visou preencher ou colmatar, na medida do possível, a falta do registo documental. Foi um trabalho colectivo iniciado em 2005 e publicado em 2008, coordenado por nós, editado pela Junta de Freguesia, com a colaboração do historiador paredense Manuel Ferreira Coelho. Os demais autores eram/são (infelizmente, dois deles já faleceram) recaredenses que sempre nutriram interesse particular pela história da terra que era sua, que conheciam ao mais ínfimo pormenor a sua geografia e as suas gentes, que guardaram memórias não apenas mentais, mas também documentais, que identificavam com clareza as referências do passado, que descreviam com detalhe muitas das tradições e práticas de outrora, bem como guardavam, pela sua veterania de vida, o não menos importante conhecimento do percurso e da acção contemporânea das instituições ou associações locais. Este projecto surge em 2005, na sequência das comemorações do sesquicentenário da freguesia e paróquia (esta última, em rigor, só completaria os 150 anos a 1 de Fevereiro de 2006). A comemoração fizera-se com pompa, mas era importante saber-se, afinal de contas, que 150 anos tinham sido aqueles que ali se comemoravam. Em Novembro de 2005, o coordenador, os autores e colaboradores reúnem-se e dão início àquela que era, e continua a ser, a obra de referência histórica da pequena freguesia e paróquia de Recarei. Três anos depois, a 15 de Agosto, o salão paroquial foi pequeno demais para receber todos aqueles que pretenderam assistir à apresentação de um livro com mais de 200 páginas ilustradas de informação histórica e etnográfica.

Disponibilidade: Restam ainda alguns exemplares, que estão à venda na sede da Junta de Freguesia de Recarei (preço actual: 15€)

[2010] Recarei e o Sacerdócio

O ano de 2010 seria dedicado pela Igreja Católica ao «Sacerdócio». Nesse contexto particular, propusemos à paróquia de Recarei uma espécie de separata, alargada e revista, do capítulo da obra «Villa Recaredi» que dedicáramos ao clero local. Revimos as biografias dos párocos e dos sacerdotes naturais da terra, acrescentámos informações sobre os bispos que passaram pela freguesia, bem como compilámos referências a outros padres que, nalgum momento ou por alguma razão, também estiveram ligados à localidade (autores de monografias que escreveram algo sobre Recarei, por ex., etc.). A obra foi coordenada por nós, em co-autoria com outro dos autores de «Villa Recaredi», Abel da Rocha Nogueira Júnior, já falecido. Prefaciou-a D. Manuel Clemente, então Bispo do Porto, mais tarde Cardeal-Patriarca de Lisboa e galardoado com o Prémio Pessoa em 2009. Posfaciou-a o pároco local, Pe. Pedro Silva. Edição da Paróquia de Recarei, 2010.

Disponibilidade: À venda no Cartório Paroquial de Recarei (preço: 10€) e reverte na íntegra para o Centro Social Paroquial de Recarei.

[2013] Crónicas Recaredenses

Das «pontas soltas» da monografia «Villa Recaredi» nasceu esta compilação de crónicas. Da necessidade de explorar melhor alguns temas, ou de clarificar aspectos ali abordados, mas também de enveredar por assuntos novos, isto é, nunca tratados localmente. Acaba por ser uma obra marcante e de grande relevo para a história de Recarei, porque revela, pela primeira vez, por exemplo, o conteúdo do documento régio fundador da localidade (Decreto de 27/11/1855 do Rei D. Pedro V), ao qual até então ninguém tinha chegado. São raras as localidades que dispõem de tal «certidão de nascimento civil». É uma compilação heterogénea, que trata múltiplos temas e épocas distintas - dos vestígios paleozóicos até acontecimentos contemporâneos -, tendo apenas como pano de fundo o espaço ou a comunidade que se pretendeu «subsidiar» historiograficamente: Recarei. Trata-se de uma edição de autor, a solo, composta de mais de 300 páginas com ilustrações.

Disponibilidade: Esgotado. Encontra-se disponível para consulta em várias bibliotecas públicas.

[2017] Paredenses na Grande Guerra

Entre 2014 e 2018, assinalou-se, um pouco por toda a parte, o centenário da participação portuguesa no primeiro grande conflito da História da Humanidade. Até à publicação de artigos do autor nos jornais O Progresso de Paredes e O Paredense, artigos esses que deram depois origem à obra em formato de livro no ano de 2017, o concelho de Paredes nada sabia acerca dos seus conterrâneos que haviam participado directamente na «guerra de 14-18». Mesmo tendo sido dada à estampa já no início da década de 20, a Monografia de Paredes (José do Barreiro, 1922) nada revelou acerca da mobilização local de expedicionários para a Grande Guerra, nem sequer o fizeram obras posteriores. Paredenses na Grande Guerra veio assim revelar, pela primeira vez, a identidade de mais de 160 combatentes de Paredes (por naturalidade ou por residência à época da mobilização) que pelejaram na Flandres (sobretudo), mas também nas campanhas africanas. Os textos de cada um revelam, tanto quanto possível, o percurso militar individual e colectivo (da sua unidade no terreno de batalha) e alguns dos principais dados biográficos (nascimento, filiação, casamento, falecimento, etc.). Obra exaustiva e bastante completa que, além das biografias propriamente ditas, enquadra os visados e as suas circunstâncias particulares no plano geral e local, sintetizando a conjuntura que então se vivia no mundo, no país e no próprio concelho de Paredes. Obra do autor, com edição da Câmara Municipal de Paredes e do Centro de Estudos Interculturais do ISCAP (CEI-ISCAP).

Disponibilidade: Alguns exemplares disponíveis na Biblioteca Municipal de Paredes (sob confirmação).

[2020] Paredes e a Primeira República

A história do período primo-republicano encontrava-se ainda por fazer em Paredes. É, de facto, riquíssimo o conjunto de circunstâncias históricas locais do período que mediou a Implantação da República (1910) e a Instauração da Ditadura Militar (1926). Esta obra trata dos principais acontecimentos políticos e religiosos (com a inevitável componente do conflito que opôs a facção democrática/afonsista do PRP ao clero e à Igreja Católica), mas não deixa de fora questões socialmente marcantes como a guerra, as crises sanitárias, o movimento associativo, a actividade da imprensa local, etc., tornando-se, desta forma, num guia essencial à compreensão de um dos períodos mais intensos e atribulados - ainda que subvalorizados ou ocultados - da história contemporânea do município de Paredes. Este livro, composto por 423 páginas com ilustrações, tal como o anterior, resulta de artigos do autor na imprensa local, sendo publicado pela Câmara Municipal em plena pandemia de Covid-19 (2020). Não teve, por isso, na altura, grande divulgação (a própria cerimónia de apresentação foi restrita ou limitada). É ainda hoje, por muitos, um trabalho praticamente desconhecido, mas a relevância e utilidade do seu conteúdo falará por si.

Disponibilidade: Alguns exemplares disponíveis na Biblioteca Municipal de Paredes (sob confirmação).

[2021] Vasco da Gama FC de Recarei

Este livro talvez não existisse - ou não teria seguramente a relevância que acaba por ter - não fosse a valia inquestionável do preservado arquivo do clube em questão. Felizmente, uma parte muito significativa e rica do espólio documental desta modesta instituição de Recarei, sobreviveu durante largas décadas e até aos nossos dias - o clube foi fundado em 1930. Esta realidade é ainda mais espantosa se tivermos em linha de conta que o Vasco da Gama passou por um longo período de inactividade na década de 90 e de 2000, ficando, entretanto, sem sede social e sem campo de jogos. Ainda assim, directores zelosos e irredutíveis apaixonados pelo clube, conservaram documentos, mormente cartas ou ofícios, que são hoje únicos e que servem, inclusive, para ajudar a escrever também a história de outros clubes e/ou associações congéneres, cujos arquivos, entretanto, se foram perdendo: por exemplo, o Aliança de Gandra (concelho de Paredes) já teve de «rever» a data que apontava como sendo a de fundação, e o Sporting Clube de Campo (concelho de Valongo) tem hoje no arquivo do Vasco da Gama o mais antigo documento (ofício) do clube até aqui conhecido. Este livro é, pois, mais do que uma súmula restrita da história de um clube desportivo local. Insere-se, mais amplamente, na memória da vasta rede de clubes do distrito do Porto, ajudando a tecer novamente, em muitos casos, o tecido histórico que arquivos efémeros foram deixando de testemunhar. Este foi o único dos livros do autor a ter uma 2.ª edição (em 2024), dado a primeira ter-se esgotado.

Disponibilidade: À venda na sede do clube ou em fnac.pt. Reverte integralmente para o clube.

[2023] Crónicas Paredenses

Trata-se de uma compilação de artigos do autor primeiramente publicados no jornal O Paredense, mas não só. Reúne também textos inéditos e investigações que, pela extensão ou outras características de forma, não se adequavam à publicação em artigo de jornal. Apesar do título, não contém apenas crónicas em sentido clássico e narrativo, digamos assim, mas também simplesmente a apresentação de fontes de natureza histórica e apontamentos de cariz etnográfico relacionados com o concelho de Paredes, ou com o seu território antes do municipalismo liberal. Merece destaque a abordagem aos documentos visitacionais, ou relatórios das Visitações episcopais desde o século XVII, fontes históricas que, no que concerne às localidades paredenses, estavam ainda por explorar. Trata-se de uma edição de autor, composta de 526 páginas ilustradas e a cores, apenas à venda na internet, em Bookmundo ou em Fnac.pt. Não estando inicialmente previsto, acabou por tornar-se este o «primeiro volume» de uma obra com continuidade, como veremos a seguir. Mais informações aqui.

Disponibilidade: À venda em Bookmundo ou em fnac.pt.

[2024] Crónicas Paredenses - Volume II

O segundo volume das Crónicas Paredenses veio dar continuidade e alguma complementaridade ao livro anterior, embora os textos se encerrem historiograficamente em si mesmos. Ou seja, não é forçoso ter-se lido o primeiro volume para se apreender o teor histórico do segundo. Se houvesse que lhe atribuir um cognome, este seria o «volume das fontes», dado ser muito significativo o número de fontes históricas transcritas e tratadas neste tomo. As respostas a inquéritos até aqui nunca invocados pela historiografia local, relações antigas de bens patrimoniais existentes, relatórios de situação, documentos de tombos monásticos, etc., merecem destaque pelo valor inestimável da informação neles contida, o que torna este volume numa prática e indispensável ferramenta para o estudo da história de cada freguesia e do concelho como um todo. Destaque ainda para a crónica de abertura e que ilustra a capa - Paredes e as Invasões Francesas - que ocupa as primeiras páginas, um tema que necessitava de sistematização e de uma abordagem que demonstrasse o enorme capital histórico - ainda que subaproveitado e desconhecido - do território paredense neste marcante acontecimento da História de Portugal. A edição é em tudo semelhante à anterior, estando à venda nos mesmos locais. Mais informações aqui.

Disponibilidade: À venda em Bookmundo ou em fnac.pt.

 

Nota final:
As estatísticas valem o que valem e os números nem sempre são suficientemente elucidativos para daí se poderem extrair conclusões aproveitáveis. Ainda assim, nestes 16 anos entre o primeiro e o último, deixando de fora artigos, conferências e colaborações noutros locais e com outros projectos, foram publicados por nós 8 (oito) livros sobre a história local, uma média simples de um livro publicado a cada dois anos. Totalizam, essas obras, 2575 páginas. É o que é e vale o que vale. O tempo é, pois, de balanços, mas aqui sem subjectividades ou adjectivos, apenas de teor descritivo e sucinto. O futuro? O futuro... ao autor pertence.  

 

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