O facto de colocarmos no título o substantivo «lenda» no plural torna, desde logo, evidente, a assunção da existência de pelo menos duas, ou até mais, narrativas de pendor tradicional associadas ao culto mariano do lugar do Salto, na freguesia de Aguiar de Sousa. E, com efeito, assim é. Todavia, importa começar por se fazer a diferenciação entre lendas distintas e «variantes» de uma mesma lenda, consistindo estas em versões pontualmente dissonantes de um mesmo quadro narrativo. Na edição de 18 de Outubro de 1874 do jornal O Primeiro de Janeiro , foi publicado um poema do naturalista Augusto Luso da Silva, a respeito de uma lenda que o próprio dizia ter ouvido, três anos antes, «nas margens do rio Sousa». Em traços gerais, consiste na epopeia de um cavaleiro, que persegue uma lebre até junto de um precipício, ao que se segue uma inevitável queda, uma piedosa e desesperada invocação de Nossa Senhora e, por fim, o milagre da desejada salvação. Isto testemunhado, claro está, pela marca das...
Em 2021, a passagem do bicentenário do nascimento de José Guilherme Pacheco potenciou a sua rememoração histórica e biográfica. Como é regra neste tipo de eventos, as comemorações e/ou celebrações encerraram-se em si mesmas, não se aproveitando a ocasião para uma reanálise histórica rigorosa da biografia do visado. Foi por isso sem causar surpresa que superabundaram textos panegíricos e essencialmente celebrativos, ainda que da autoria de académicos da área da História, concebidos de princípio a fim para secundar e reafirmar qualidades e méritos, sendo uns reais e outros, dizemos nós, imaginários. Portanto, o resultado foi o de sempre: a reafirmação furtiva de uma imagem impoluta de José Guilherme, de «regência absoluta» local, despida de roupagens negativas, de oposições e/ou contestação. Na recente reedição fac-similada da Monografia de Paredes, um texto introdutório refere-se à «alma» de Guilherme como repousando no mausoléu ainda «cheia de luz e bondade». Sucede, porém, que, como é...
No século XIX, muito antes da existência de edifícios próprios para o ensino, as escolas da freguesia funcionavam em casas – ou anexos de casas – particulares, cujo aluguer era pago pela Junta de Paróquia. Vamos, aqui, ocupar-nos desses locais e de o que sabemos acerca dos respectivos professores. Como mencionado na monografia «Villa Recaredi» (2008, p. 140), a mais antiga referência a uma escola na localidade reporta ao ano de 1844, altura em que Recarei era ainda lugar da Sobreira. A existência deste estabelecimento coincide com importantes reformas educativas de Costa Cabral, que inclusivamente fixavam penalizações para os pais que «descurassem a educação literária dos seus filhos». Na época, registe-se, só 13% das crianças em idade escolar frequentava o ensino (Pimenta, 2006). O tipo ministrado em Recarei era de carácter «simultâneo», ou seja, leccionado a ambos os sexos (mas não «misto»), e esta era apenas uma das quatro escolas que existiam, à época, em todo o concelho de Paredes...
Terá sido o militar Henrique Galvão, na altura já detido por conspirar contra o regime e, mais tarde, protagonista do célebre episódio do paquete «Santa Maria», a colocar ao general Humberto da Silva Delgado a hipótese da candidatura deste à presidência da República como «melhor método para depor Salazar». O ainda putativo candidato, não obstante ter participado activamente no golpe de 28 de Maio de 1926 – que ele considerara entretanto ter sido «falseado» – e ter exercido vários cargos diplomáticos com a chancela do Poder, havia recusado aderir à União Nacional e dado mostras de oposição ao carácter opressivo da ditadura. Acrescia ainda, ao seu estado de espírito contestatário, uma certa revolta contra agravos e desmerecimentos particulares de que fora alvo durante a sua carreira. No início de um dos capítulos do seu livro de memórias, o general da Força Aérea faz uma radiografia concisa, mas objectiva, do país: «De alto a baixo, Portugal é um país de pobres, que pede pão, ou trabalho...
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Na segunda metade do século XIX, mais concretamente por volta de 1865, uma sociedade de investidores britânicos decide apostar na extracção de metais, minerais e na exploração de lajes e ardósias do solo e subsolo do concelho de Valongo. É fundada a empresa «The Vallongo Slate & Marble Quarries Company, Limited», com sede em Londres e zona de extracção industrial sobretudo no concelho valonguense, mas também em Penafiel (Serra da Boneca). A exportação para Inglaterra e Estados Unidos tinha peso maioritário no volume de negócios, tendo o sector sido gravemente afectado pelas consequências da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Porém, seriam os efeitos do crash bolsista de 1929 a significar o fim da presença inglesa na exploração lousífera da região. Em 1930, o activo e passivo da companhia seriam adquiridos pela recém-criada Empresa das Lousas de Valongo (ELV), que, apesar das várias vicissitudes e alterações de proprietário, se manteve em actividade durante décadas, subsistindo ...
Judas Iscariotes, o apóstolo que, segundo o Novo Testamento, entregou e traiu Jesus Cristo, não tem, precisamente por essa razão, o estatuto de «santo» no rol hagiológico da Igreja Católica. Daí que a referência irónica do título tenha aqui apenas um único propósito: chamar a atenção para a singularidade de um dos vitrais da igreja paroquial de Castelões de Cepeda, precisamente aquele que representa a personagem «maldita» da Última Ceia . Nessa composição figurativa, Judas aparece com a sua «inseparável» bolsa dos dinheiros, com a veste manchada, mas também com a auréola, ou halo, a envolver-lhe a cabeça, sendo este último elemento, de facto, aquele que mais pode destoar ou surpreender o visitante. Como é sabido, ainda que com origens pagãs, ou anteriores ao cristianismo, o aro dourado , também chamado auréola ou halo, transformou-se, entretanto, num «dos símbolos ou atributos gerais da iconografia cristã, com o qual se distinguem as imagens sagradas das profanas» (GEPB, Vol. 2, p.72...
A chamada «Guerra da Patuleia» (1846-1847) não teve dimensão comparável à Guerra Civil que deflagrara entre 1832 e 1834. No entanto, aquela derivou em grande medida desta. Os intervenientes políticos e militares acabaram por ser praticamente os mesmos, mas assentando a particularidade e originalidade dos acontecimentos de 1846-47, no facto de os outrora opositores e adversários, estarem agora «unidos» contra um inimigo comum: o «cabralismo». Na sequência da revolta minhota da Maria da Fonte, no dia 20 de Abril de 1846, o governo em funções é derrubado e o seu chefe, António Bernardo da Costa Cabral, forçado a refugiar-se em Espanha. A rebelião findou ali, mas as disputas pelo poder iriam continuar, protagonizadas por políticos e por militares, sobretudo por aqueles que eram as duas coisas. As principais facções dividiam-se entre os defensores da Constituição de 1822, ou setembristas (repartidos entre moderados e radicais ); os apologistas da Carta Constitucional de 1826, ou cartistas...
O Livro dos Capítulos de S. Miguel de Beire (ADioP, 383) inicia-se em 1823. Trata-se, na verdade, de um segundo livro de visitações desta paróquia, dado que o primeiro, que compreendia o período de 1676 a 1815, terá «desaparecido» (Silva, 2007:71, n.d.r.). Mesmo o livro subsistente, encontramo-lo já «mutilado», faltando duas dezenas de folhas do seu conteúdo. Desta remanescência, constam apenas três relatórios, que dizem respeito às visitas realizadas nos anos de 1823, 1903 e 1930. É importante deixar a indicação de que as Visitas Pastorais, tal como foram definidas pelo Concílio de Trento (séc. XVI), se extinguiram em 1833 (Silva, 2007:58). No entanto, as deslocações oficiais do bispo diocesano às comunidades da sua jurisdição continuaram a realizar-se depois dessa data sob uma outra organização, com muito menor abrangência e diminuição substantiva do seu primitivo carácter vigilante e correctivo. Ainda assim, como veremos, pelo menos até ao início do século XX, os prelados não deixa...
Nos assentos da paróquia de Vandoma ficou também, para memória, o registo da morte de um soldado miliciano daquela localidade. Ao que tudo leva a crer, estando gravemente ferido, fora levado para o Mosteiro de Paço de Sousa, onde havia sido instalado um hospital de campanha (ADP, Reg. Par. Óbitos, Vandoma, fls.105v.): «Em o dia 11 para 12 de Fevereiro de 1833 faleceu no Hospital Militar estabelecido no Mosteiro de Paço de Sousa José Coelho Raiva casado com Miquelina Dias do lugar de Aldeia desta minha freguesia de Santa Eulália de Vandoma com testamento tinha de idade trinta e seis anos, era miliciano, e foi ali sepultado e para constar fiz este termo era ut supra digo fiz este termo aos 24 dias do dito mês e ano. O Abade José Pinto de Almeida.» Em Março de 1833, um soldado aquartelado em Paredes morre vítima não das balas, mas de doença (ADP, Reg. Par. Óbito, Castelões de Cepeda, 1833, fls. 230): «António Teixeira da Silveira, soldado voluntário Realista do Batalhão dos Voluntários d...
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