Paredes e a Guerra Civil (1832-1834) - IV
Em Maio de 1834, a guerra termina com a Convenção (ou Concessão) de Évora-Monte, formalizando a rendição incondicional das forças de D. Miguel. Um dos «convencionados» miguelistas, i.e. perdoado ou amnistiado pelo acordo, foi o então comandante da 1ª Companhia de Granadeiros do Regimento nº 11 de Infantaria, João Correia Pacheco Pereira de Magalhães, pai de José do Barreiro, autor da Monografia de Paredes (Leal, 1878:13). Importa, por isso, deixar aqui uma breve nota biográfica.
Nasceu na freguesia de Mafamude, Vila Nova de Gaia, a 27 de Setembro de 1811. Casou com Maria Adelaide da Cunha Teixeira de Vasconcelos de Portocarrero, da Casa do Barreiro, freguesia de Madalena, concelho de Paredes. O casal teve doze filhos, entre eles o já citado autor da Monografia, merecendo ainda menção particular António Correia de Portocarrero Teixeira de Vasconcelos, militar e destacado político republicano, a quem, de resto, Paredes deve a manutenção de Lordelo no seu concelho (vide Paredes e a Primeira República, Silva, 2020:282 e ss.).
Nasceu na freguesia de Mafamude, Vila Nova de Gaia, a 27 de Setembro de 1811. Casou com Maria Adelaide da Cunha Teixeira de Vasconcelos de Portocarrero, da Casa do Barreiro, freguesia de Madalena, concelho de Paredes. O casal teve doze filhos, entre eles o já citado autor da Monografia, merecendo ainda menção particular António Correia de Portocarrero Teixeira de Vasconcelos, militar e destacado político republicano, a quem, de resto, Paredes deve a manutenção de Lordelo no seu concelho (vide Paredes e a Primeira República, Silva, 2020:282 e ss.).
Segundo o genealogista Abranches de Soveral, João de Magalhães «aderiu com 21 anos de idade ao exército legitimista, sendo então nomeado capitão da 3ª Companhia do Regimento de Milícias da Feira. Pouco depois, em Abril de 1834, foi nomeado comandante da 1ª Companhia de Granadeiros do Regimento nº 11 de Infantaria, posto no qual combateu valorosamente na batalha da Asseiceira, travada a 16 de Maio daquele ano, e se manteve até ao fim das hostilidades, sendo um dos convencionados de Évora Monte. Regressou depois a Coimbra, onde interrompera o seu curso de Direito, vindo a licenciar-se a 8.7.1840. De regresso à quinta do Maravedi, exerceu aí advocacia até 1845, data em que foi nomeado juiz ordinário do julgado de Paredes. Depois de ter desempenhado este cargo durante cinco anos, foi nomeado a 28.7.1851 administrador do concelho de Paredes, importante lugar que ocupou durante 12 anos, até 1.9.1863, data em que foi exonerado a seu pedido, por “não querer ser juiz com taes mordomos”» (Soveral, in www.soveral.info/mas/Maravedi.htm, acesso a 23/06/2023).
Outra figura do concelho cuja vida ficara também ligada à Guerra Civil, foi a do general e proeminente literato António Augusto Teixeira de Vasconcelos, antigo proprietário das quintas de Coura (Bitarães), da Vidigueira (Besteiros), da Cova e Moinho (Madalena). O conflito «apanhara-o» somente em 1834, a poucos meses do fim, mas consideramos que se justifica fazer-lhe aqui, ainda assim, uma sucinta referência.
Nascido na cidade do Porto a 1 de Novembro de 1816, era o único filho de D. Maria Emília de Sousa Rocha Moreira Barbosa de Sampaio e do brigadeiro António Vicente Teixeira de Sampaio, veterano das Campanhas Peninsulares. Residiu na já referida quinta de Coura, em Bitarães, entre 1823 e 1845 (Soveral, in Dicionário das Figuras Histórias de Paredes, separata da revista Orpheu n.º3, 2021:5). Com apenas 17 anos de idade, o futuro escritor e jornalista integrara o Regimento de Milícias de Penafiel, ostentando a patente de capitão. Depois do conflito de 1832-34, participaria também na revolta da Patuleia (1846), tendo-se, entretanto, formado (1844) Bacharel em Direito na Universidade de Coimbra (ibid., idem).
Não obstante a curta experiência de Teixeira de Vasconcelos ao serviço da causa miguelista, «as suas ideias políticas haviam-se entretanto modificado profundamente. Desejoso de acompanhar o partido em que de princípio se colocara, deu-se à leitura das obras de Chateaubriand, e foram estas que para logo o transformaram em liberal. Sendo por isso agredido no Tribuno d’Almacave, separou-se formalmente dos realistas, por uma declaração que fez publicar na Revolução de Setembro, sem que nenhum emprego ou graça viessem nessa época, nem depois, diminuir ou por em dúvida a sinceridade da sua conversão. Declarou-se liberal progressista, mas monárquico, e diz que assim espera ficar» (Dic. Bibliográphico Portuguez, Tomo VIII, 1867:89).
Merece ainda menção «o pároco de Rebordosa mais famoso do século XIX» (A. Gomes de Sousa in Monografia de Rebordosa, 2014:95-99), de nome Alvito Buela Pereira de Miranda (1791-1862). Nascido na Galiza, frade beneditino, militante absolutista, combateu em Portugal pela causa anticonstitucional em 1823 e 1826, tendo neste último ano sido forçado a regressar a Espanha. Pertenceu, como capelão e soldado, à 1.ª Companhia do Batalhão de Voluntários Realistas de Vila Real. Demitiu-se ao ser nomeado para a paróquia de Rebordosa, no ano de 1830 (ibid., idem).
Outra figura do concelho cuja vida ficara também ligada à Guerra Civil, foi a do general e proeminente literato António Augusto Teixeira de Vasconcelos, antigo proprietário das quintas de Coura (Bitarães), da Vidigueira (Besteiros), da Cova e Moinho (Madalena). O conflito «apanhara-o» somente em 1834, a poucos meses do fim, mas consideramos que se justifica fazer-lhe aqui, ainda assim, uma sucinta referência.
Nascido na cidade do Porto a 1 de Novembro de 1816, era o único filho de D. Maria Emília de Sousa Rocha Moreira Barbosa de Sampaio e do brigadeiro António Vicente Teixeira de Sampaio, veterano das Campanhas Peninsulares. Residiu na já referida quinta de Coura, em Bitarães, entre 1823 e 1845 (Soveral, in Dicionário das Figuras Histórias de Paredes, separata da revista Orpheu n.º3, 2021:5). Com apenas 17 anos de idade, o futuro escritor e jornalista integrara o Regimento de Milícias de Penafiel, ostentando a patente de capitão. Depois do conflito de 1832-34, participaria também na revolta da Patuleia (1846), tendo-se, entretanto, formado (1844) Bacharel em Direito na Universidade de Coimbra (ibid., idem).
Não obstante a curta experiência de Teixeira de Vasconcelos ao serviço da causa miguelista, «as suas ideias políticas haviam-se entretanto modificado profundamente. Desejoso de acompanhar o partido em que de princípio se colocara, deu-se à leitura das obras de Chateaubriand, e foram estas que para logo o transformaram em liberal. Sendo por isso agredido no Tribuno d’Almacave, separou-se formalmente dos realistas, por uma declaração que fez publicar na Revolução de Setembro, sem que nenhum emprego ou graça viessem nessa época, nem depois, diminuir ou por em dúvida a sinceridade da sua conversão. Declarou-se liberal progressista, mas monárquico, e diz que assim espera ficar» (Dic. Bibliográphico Portuguez, Tomo VIII, 1867:89).
Merece ainda menção «o pároco de Rebordosa mais famoso do século XIX» (A. Gomes de Sousa in Monografia de Rebordosa, 2014:95-99), de nome Alvito Buela Pereira de Miranda (1791-1862). Nascido na Galiza, frade beneditino, militante absolutista, combateu em Portugal pela causa anticonstitucional em 1823 e 1826, tendo neste último ano sido forçado a regressar a Espanha. Pertenceu, como capelão e soldado, à 1.ª Companhia do Batalhão de Voluntários Realistas de Vila Real. Demitiu-se ao ser nomeado para a paróquia de Rebordosa, no ano de 1830 (ibid., idem).
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Caricatura da «Guerra dos Dois Irmãos» (H. Daumier) |
Em 1829, o reverendo Alvito pediu a D. Miguel a deferência do uso «da Sua Augusta Efígie, em Medalha de ouro», o que, em cerimónia de beija-mão, lhe foi concedido. Depois de já estar em terras que viriam a ser do concelho de Paredes, solicitou a mesma honra para vários outros correligionários locais: Pe. Eusébio Nunes Moreira Ribeiro, coadjutor de Louredo, e família; António Nunes Moreira Ribeiro, de Bitarães, tenente reformado das Milícias da Maia, e família; José Joaquim Pinto Coelho, da casa e quinta de Louredo, anexa à Honra de Sobrosa, e família; José Luís Pinto, capitão das Ordenanças da Honra de Baltar e seus irmãos Francisco José Pinto e António José da Silva Júnior, alferes das mesmas, bem assim como suas irmãs Rita, Maria, Teresa e cunhado João Joaquim de Miranda; Frei Manuel da Rocha, vigário de Cete; Pe. Joaquim Barbosa, cura de Rebordosa; António Inácio da Cunha, de Cristelo (ibid., idem); e, por fim, Gonçalo José Carneiro, ex-Juiz Ordinário da Freguesia, e Honra de Louredo (Gazeta de Lisboa n.º 74, 1830).
O padre Alvito abandonou a paróquia, que servia há apenas dois anos, em Maio de 1832. Nessa altura, no semanário Defeza de Portugal, lamentava estar «ameaçado de morte» e não ter «segurança neste ermo de Rebordosa!» (idem, p. 98).
Ainda que a maioria o fosse, como temos visto, nem todas as mais destacadas personalidades paredenses do século XIX se encontravam ideologicamente no campo absolutista. Sérgio de Morais Alão, tido como principal responsável pela elevação de Paredes a Vila (1844), por exemplo, que havia sido citado pela Alçada em 1829, integrara o Exército Libertador enquanto capitão de Infantaria (mais tarde major e tenente-coronel) do Arsenal Real (Marques, in Orpheu Paredes n.º1, 2019).
Em jeito de conclusão, deste período conturbado da história portuguesa que foi a Guerra Civil entre liberais e absolutistas (1832-1834), que aspectos mais significativos se acham então ligados ao território que hoje constitui o concelho de Paredes?
Embora as balizas deste trabalho o confinem às hostilidades propriamente ditas, é certo que há aspectos históricos importantes anteriores ao «desembarque do Mindelo» e umbilicalmente ligados ao contexto posterior. É o caso dos «mártires da liberdade», vitimados pela perseguição miguelista, com o juiz baltarense Manuel Luís Nogueira em destaque, sem esquecer a lista de homens das várias freguesias do actual concelho colocados sob a égide da Alçada em 1829.
Vimos aqui como, poucos dias depois de desembarcar a norte do continente, um regimento liberal, comandado por um britânico, partiu rumo a Penafiel, parando em Baltar e enfrentando guerrilhas absolutistas nas redondezas, possivelmente em Mouriz e, já com certezas, em Castelões de Cepeda.
Vimos também como um grande dispositivo militar de milhares de homens, passando o Douro e atravessando as íngremes serras de Aguiar de Sousa, acabou por estabelecer quartel-general em Recarei. Abordaram-se ainda as circunstâncias da grande batalha de Ponte Ferreira, travada no extremo da freguesia de Gandra, onde além das muitas vítimas dos exércitos em disputa, também houve quem fosse atingido colateralmente por estar ao alcance dos projécteis.
Constatámos também como, no início de Agosto de 1832, fora estabelecido um quartel-general na freguesia de Baltar, a partir do qual o seu comandante ordenara o bloqueio de materiais e víveres que seguiam para o Porto, com vista a impedir o abastecimento total de meios de subsistência aos liberais sitiados na cidade. Também há notícia histórica da chegada das unidades do Visconde do Peso da Régua, uma vez mais, a Recarei, e que precedeu a grande investida realista de dia de S. Miguel. Destes acampamentos, resultava quase sempre a necessidade aprovisionamento de tropas, o que era feito por saque às populações locais, como sucedeu, pelo menos, em duas das localidades paredenses (Sobrosa e Recarei).
Ao longo de todo este período, encontrámos registos de vítimas daquele que viria a ser o município de Paredes, sendo alguns naturais das suas actuais freguesias, outros tombados nelas – em trânsito ou em missão –, descritos uns com a simplicidade proporcional às suas vidas e trabalhos, outros com as distinções ou honrarias que lhes eram então reconhecidas. Das várias personalidades oitocentistas que pontificam na História local, notáveis padres ou membros das «famílias mais ilustres» do concelho, o mais saliente facto é que, pese embora «conversões» ulteriores, quase todos eram afectos ao miguelismo.
Através dos Livros Mestres das unidades em confronto, pudemos aferir da identidade e percurso de dezasseis dos paredenses mobilizados, como breve amostra de tantos outros que foram parte activa – de forma voluntária ou forçada - nos acontecimentos aqui narrados.
Em suma, a História da Guerra Civil em Portugal não se faz de modo completo sem menção às terras de Paredes. Do mesmo modo, Paredes também não pode olhar para o seu passado sem reconhecer as incidências bélicas das quais foi palco, dos seus protagonistas, mais ou menos famosos, das suas causas e, sobretudo, das consequências. Afinal, e não obstante ser terra conservadora onde medraram muitos adeptos do Antigo Regime, é ao triunfante liberalismo emergido deste conflito que o concelho de Paredes deve, precisamente, a sua existência.
Ao longo de todo este período, encontrámos registos de vítimas daquele que viria a ser o município de Paredes, sendo alguns naturais das suas actuais freguesias, outros tombados nelas – em trânsito ou em missão –, descritos uns com a simplicidade proporcional às suas vidas e trabalhos, outros com as distinções ou honrarias que lhes eram então reconhecidas. Das várias personalidades oitocentistas que pontificam na História local, notáveis padres ou membros das «famílias mais ilustres» do concelho, o mais saliente facto é que, pese embora «conversões» ulteriores, quase todos eram afectos ao miguelismo.
Através dos Livros Mestres das unidades em confronto, pudemos aferir da identidade e percurso de dezasseis dos paredenses mobilizados, como breve amostra de tantos outros que foram parte activa – de forma voluntária ou forçada - nos acontecimentos aqui narrados.
Em suma, a História da Guerra Civil em Portugal não se faz de modo completo sem menção às terras de Paredes. Do mesmo modo, Paredes também não pode olhar para o seu passado sem reconhecer as incidências bélicas das quais foi palco, dos seus protagonistas, mais ou menos famosos, das suas causas e, sobretudo, das consequências. Afinal, e não obstante ser terra conservadora onde medraram muitos adeptos do Antigo Regime, é ao triunfante liberalismo emergido deste conflito que o concelho de Paredes deve, precisamente, a sua existência.
HODGES, George Lloyd. Narrative of the Expedition to Portugal in 1832, Under the Orders of His Imperial Majesty Dom Pedro, Duke of Braganza. Volumes I e II. Londres: James Fraser, 1833.
MOREIRA, Paulo. A Batalha de Ponte Ferreira (Campo, Valongo, 1832): um processo memorialista e de valorização patrimonial. Dissertação de Mestrado em História e Património – Ramo de Estudos Locais e Regionais: Construção de Memórias. Porto: FLUP, 2012.
NAPIER, Charles. A Guerra da Sucessão entre D. Pedro e D. Miguel. Manoel Joaquim Pedro Codina (trad.). Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2005.
PINTO, José. Sobrosa: História e Património. Vols. 1 e 2. Sobrosa: Ed. Jornal de Sobrosa, 2007 e 2013.
SILVA, Ivo R. (coord.) et al. Villa Recaredi : Estudo Histórico e Etnográfico da Freguesia e Paróquia de Recarei. Recarei: J.F. Recarei, 2008. SILVA, Ivo R. Crónicas Recaredenses: Subsídios para a História de Recarei. Ed. Autor. Ermesinde: Grafislab, 2013.
SORIANO, Simão. História do Cerco do Porto. Porto: A. Leite Guimarães, 1889.
Gazeta de Lisboa.
Crónica Constitucional.
Livros Mestres, Arquivo Histórico Militar (várias unidades).
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