As Visitações em Castelões de Cepeda (IX)
No dia 5 de Julho de 1786, desloca-se a Castelões de Cepeda o Dr. José Barbosa de Albuquerque, desembargador da Mesa Episcopal. Do relatório respectivo citamos o seguinte: «Examinei ocularmente o tecto da igreja e seu coro, e tudo achei em grande necessidade de conserto, ou de se fazer de novo, pelo que mando, ou se conserte tudo em termos ou se faça de novo para o que, atendendo à pobreza da freguesia, lhe concedo o tempo de um ano; pena de que se não fazendo passado ele se proceder na forma de direito a que isso dará o R.do Pároco parte a juízo no termo de quinze dias.»
Sobre a capela de S. José ficou escrito: «Fui informado que na Capela de S. José se pôs uma caixa para esmolas sem licença do R.do Pároco, nem querendo-lhe entregar a chave dela, obrando-se nestes termos contra a jurisdição paroquial, pelo que mando, que qualquer pessoa, que tiver a chave da dita caixa a entregue incontinente ao dito R.do Pároco a quem de direito pertence; e negando-lha o mesmo R.do Pároco proceda com o direito que lhe assiste; e se porá na dita capela uma vidraça.»
O Dr. Manuel Lopes Loureiro, abade de S. João de Grilo, conduziu a visita de 2 de Julho de 1790. Depois de determinações de carácter geral, o emissário estipulou o que se segue: «Para evitar indecências e superstições proíbo que os paramentos e cálices das capelas estejam em casa dos seculares, e quando algum esquecido do respeito que se deve a tudo o que serve para o incruento sacrifício da missa obrar o contrário o R.do Pároco dará para juízo para ser severamente castigado quem contravier ao disposto neste capítulo. O juiz, ou oficiais da igreja não emprestem imagens, paramentos, ou outra qualquer coisa pertencente à mesma igreja de baixo da pena de excomunhão por prejuízo que com isto se causa aos fregueses. Dourem-se por dentro dois cálices e patenas (…)»
Acerca das capelas, no documento desta visita ficou o seguinte: «Declaro que na Capela de S. José se componha de novo o telhado segurando-o com cal e encarne-se a imagem do S. Cristo ou ponha-se nova. Segure-se o retábulo repregando-o bem, faça-se uma estante para o missal e a porta travessa ponha-se nova com a dobradiça e segure-se a principal com tranca por dentro. Na capela da Sra. Da Guia repara-se o telhado, para que nela não chova, estas obras se cumprirão dento de seis meses e não se fazendo assim o R.do Pároco dê parte a Juízo (…)».
Quatro anos depois, a 14 de Junho, o emissário episcopal foi o Dr. Manuel de Sousa e Silva, pároco de Nevogilde. De particular, ficaram estas indicações: «Fui informado que os telhados da igreja precisam muito de ser compostos, pelo que no termo de dois meses se consertem, e não o fazendo assim os oficias da Confraria do Subsino hei por cominada a pena de dois mil réis aplicados para a mesma obra. Na Capela de S. José necessita-se de uma casula branca de Damasco, ponha-se com toda a brevidade possível.» A terminar, o visitador ordenou que se observasse o determinado nos capítulos das visitas de 1780 e de 1790.
O relatório seguinte é datado de 25 de Julho de 1813, sendo responsável pela visita o próprio bispo do Porto, D. António de São José de Castro. Em primeiro lugar, o prelado determina a execução pontual dos capítulos da visita de 1780. Depois são deixadas instruções gerais dirigidas aos eclesiásticos e ainda um curioso capítulo acerca do lugar que as mulheres ocupavam nas capelas-mores das igrejas e nas proximidades dos confessionários: «É muito estranhável o abuso que se tem introduzido, eu mesmo em algumas partes o tenho observado de se admitirem no tempo da missa mulheres nas capelas mores e junto aos altares. Portanto nenhuma aí se deve conservar debaixo da pena da Constituição e de Direito e espero dos R.dos Párocos e do seu zelo pela observância das determinações da Igreja as não admitam em semelhante tempo nas capelas mores, e todo o R.do Sacerdote que celebrar com elas junto aos altares e sem as fazer apartar para o seu competente lugar além da pena de suspensão em que ipso facto incorrerá por três dias será condenado em quinze dias de exercícios espirituais no Seminário Episcopal deste Bispado ou em alguma comunidade religiosa e com esta mesma pena será castigado o confessor que consentir tão junto ao confessionário as mulheres que possam ouvir o segredo da confissão (…) e para que isto não aconteça as fará apartar e não obedecendo elas sairá do confessionário.»
Depois das «providências gerais», o visitador ocupa-se do que é particular. E visitando a igreja a encontrou «com toda a decência e limpeza e o R.do Par.º muito zeloso em prover tudo o necessário para a decência e pertença do culto, e gravidade dele, e por isso esperando que não só continue no mesmo mas promova o das capelas da freguesia e lhe recomendo que vigie sobre estas fazendo que sempre estejam providas de tudo o necessário em termos que não haja falta que estranhar, o que praticará principalmente com a Capela de S. José que precisa muito de reedificação não só no retábulo mas em outras muitas coisas que lhe foram advertidas assim como na da Guia o que não é necessário repetir-lhe.»
Nesta altura, sepultar em caixão era um luxo. Além do mais, os ataúdes ocupavam muito espaço e eram encarados como sinal de vaidade: «Como por parte dos fregueses me foi representado que quando tinham acordado em que nada se desse pelas sepulturas, não tinham previsto o grande abuso que se tem feito em se sepultar os defuntos em caixões ocupando com eles muito maior espaço de terra, e resultando daqui não poderem ser sepultados todos na igreja sendo que dos caixões só se usava por vaidade pedindo-me que sobre isto desse alguma providência: determino que daqui em diante o R.do Par.º não permita sepultar alguém em caixão sem que satisfaça em benefício da freguesia e da Confraria Geral do Subsino a quantia de dois mil e quatrocentos réis em compensação do prejuízo que causa à mesma freguesia.»
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Capela de Nossa Senhora da Guia, Castelões de Cepeda, na actualidade |
A 26 de Novembro de 1820, o emissário é o Dr. António Navarro de Andrade, Cavaleiro da Ordem de Cristo e abade de Bitarães. Nada de particular há a extrair.
O relatório que se segue diz respeito a uma examinação pastoral que teve lugar a 11 de Agosto de 1840. Foi responsável pela mesma o reverendo João José Xavier Coelho Cardoso Nobre, abade de Bitarães. Nesta circunstância fora determinado: que se rebocasse o telhado da igreja onde fosse mais necessário, que se fizessem umas âmbulas novas e um crucifixo para a sacristia. Também para a residência paroquial, era pedida a reparação do respectivo telhado.
Nas últimas páginas do livro de Visitações de Castelões de Cepeda, constam dois registos de inegável interesse histórico e patrimonial. Transcrevemo-los em seguida:
«Declaração a instâncias desta Freguesia de Castelões de Cepeda, para sempre constar nos futuros tempos. Tendo Sua Majestade El Rei o Senhor D. Miguel 1.º, Nosso legítimo Monarca, mandado por várias vezes aos Ministros e Prelados que zelassem o Culto Divino e exercitassem Actos de Religião e Piedade, que tempos desgraçados e revolucionários tinham posto em abandono e esquecimento se não era criminoso desprezo, logo os Prelados do Reino, Patriarca, Cardeal, Bispo Conde de Coimbra e do Porto, o Ex.mo Sr. D. João de Magalhães e Avelar expediu (…) em data do primeiro de Fevereiro de 1830 em que depois de mudar o jejum da vigília de S. Matias no último parágrafo diz que aproveita aquela ocasião para repetir aos R.dos Párocos o zelo e eficácia no pregar a Religião, Culto Divino, máxime nos exercícios da próxima Quaresma que assim lhe recomenda S. Majestade. Animados os fregueses de Castelãos de Cepeda com estas exortações e para melhor se prestarem a obediência do Ex.mo Prelado ordens Régias e práticas do seu Abade se animaram a reedificar algumas cruzes da Via Sacra que vai desde a igreja até ao alto do Monte Calvário fizeram-se as cruzes à custa do Povo e uma foi embargada pela Casa das Pias e da de José de Sousa de Abadim, ficou esta no chão em desprezo exposta a ser calcada dos animais e inimigo do culto, o Povo interrompido no seu zelo e devoção das via sacras que já faziam suprindo a cruz da freguesia posta no pedestal e base de pedra que se conserva onde há mais de 300 anos foi colocada. As outras se levantaram no sábado 3 de Abril, no Domingo de Ramos 4 de manhã por eu ter Breve Pontifício para o fazer, e nessa tarde tornou a ir o Povo todo à sua Via Sacra para adorar de novo as cruzes reedificadas, (…) ficou a embargada que supriu a da freguesia tudo com muito sossego, paz e união de religiosos e devotos sentimentos como faziam seus passados e avós, o que para assim constar fiz este assento e declaração em Castelãos de Cepeda aos 5 de Abril do ano de 1830. O abade D. José de Noronha Faro e Lucena.» Sobre este sacerdote vide artigo de António Assunção, in Orpheu Paredes, 2021, pp. 100-101. «Ao reedificar as cruzes quebradas sucedeu que duas mulheres embargaram uma que esteve em desprezo mais de um ano e pela Pastoral supra e segunda de 16 de Fevereiro de 1831 se requereu ao Vigário Geral de Penafiel para a mandar levantar sem atenção ao nulo embargo o qual despachou nos termos seguintes: Atento ao exposto podem os suplicantes levantar a cruz na forma que pretendem o que deviam já ter praticado salvo todavia qualquer direito de terceiro para a acção competente (…) sem suspensão do levantamento da cruz. Penafiel, 11 de Abril de 1831 (…).»
Fonte:
Livro de Visitações de São Salvador de Castelões de Cepeda, Arq. da Dioc. Porto, n.º404 (1700-1831).
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